segunda-feira, 25 de março de 2013

Publicado na Gazeta Regional de Goioerê em 23/03/2013


Se o obrigam a prometer, prometa. Se tem mêdo de dizer não, diga sim. O crime não é seu, mas de quem tenta violar a sua livre escolha. Se, do lado de fora da seção eleitoral, você depende e tem mêdo, não se esqueça de que DENTRO DA CABINE INDEVASSÁVEL VOCÊ É UM HOMEM LIVRE. Falte com a palavra dada à fôrça, e escute apenas a sua consciência. Palavras o vento leva, mas a consciência não muda nunca, acompanha a gente até o inferno". (Rachel de Queiroz)

 

 

Rachel de Queiroz está além das frases pseudointelectuais de autoria duvidosa retratadas nas redes sociais, foi bem mais quem isso, foi uma mulher que mesmo em uma época machista, retratou como ninguém a mulher nordestina. Além disso, sempre lutou em favor dos seus ideais, fosse dentro ou fora do partido comunista, este que ela integrou por algum tempo.

Nordestina de origem aristocrática, professora e acima de qualquer coisa MULHER, essa grande escritora nacional também foi a primeira mulher a integrar a Academia Brasileira de Letras.

As mulheres que a autora criou em sua obra ultrapassavam a linha do feminismo, eram mulheres guerreiras em busca da sobrevivência em uma parte do país em que a vida se tornava bem mais difícil. “Nunca fui feminista, disse. Não acredito nessa entidade particular 'a mulher', diferenciada da outra entidade 'o homem'”.

Morreu aos 92 anos deixando um grande acervo literário. Suas obras são ponto de partida para qualquer tipo de pesquisa sobre regionalismo nordestino e retratam de forma clara e objetiva a vida do sertanejo.

Rachel é mais uma das grandes guerreiras nacionais que não podem ser esquecidas. Revelou-se eterna ao nos legar toda sua escrita e sensibilidade.


Eis que temos aqui a Poesia,
a grande Poesia.
Que não oferece signos
nem linguagem específica, não respeita
sequer os limites do idioma. Ela flui, como um rio.
como o sangue nas artérias,
tão espontânea que nem se sabe como foi escrita.
E ao mesmo tempo tão elaborada -
feito uma flor na sua perfeição minuciosa,
um cristal que se arranca da terra
já dentro da geometria impecável
da sua lapidação.
Onde se conta uma história,
onde se vive um delírio; onde a condição humana exacerba,
até à fronteira da loucura,
junto com Vincent e os seus girassóis de fogo,
à sombra de Eva Braun, envolta no mistério ao
mesmo tempo
fácil e insolúvel da sua tragédia.
Sim, é o encontro com a Poesia.

Geometria dos Ventos – Rachel de Queiroz

 
Tirinha by Katsumi Sato e Lie Kikuchi

Publicado na Gazeta Regional de Goioerê em 16/03/2013


Quero a utopia, quero tudo e mais
Quero a felicidade nos olhos de um pai
Quero a alegria muita gente feliz
Quero que a justiça reine em meu país”.

(Milton Nascimento)

 

A mulher de hoje é a verdadeira descrição do dito popular: “sempre atrás de um grande homem existe uma grande mulher.”.

Marisa Letícia, a esposa de Luiz Inácio Lula da Silva, ao que parece é apenas uma mulher de um grande político, só que não...

Marisa ficou viúva jovem, de uma forma extremamente injusta, lutou, trabalhou e nesse percurso conheceu o marido atual, o então sindicalista Lula. Casaram-se e ela então se engajou na luta sindical.

Foi a responsável por confeccionar a primeira bandeira do Partido dos Trabalhadores, liderou a marcha das mulheres em prol da causa sindical em São Paulo, reuniu uma multidão na Catedral de São Paulo para sensibilizá-los sobre os maus tratos que os operários sofriam no ABC paulista.

Essa grande mulher sempre esteve ao lado de seu marido, o encorajando, administrando a família nos períodos de crise, lutando em prol de suas ideologias, militando em suas campanhas políticas.

Marisa é o exemplo vivo de como uma mãe de família deve ser, deixando de lado os padrões pré-estabelecidos de que uma mulher independente precisa quebrar com o modelo de boa dona de casa, ela consegue ser feminista, companheira, mãe e militante, sem deixar a essência e os valores familiares de lado.

Vale a pena conferir a biografia dessa grande mulher que como outras mães nesse país a fora dá conta, sim, de sua família e de sua luta ideológica.

 

Essa menina, essa mulher, essa senhora
Em que esbarro toda hora
No espelho casual
É feita de sombra e tanta luz
De tanta lama e tanta cruz
Que acha tudo natural.”

(Elis Regina)
tirinhas by Katsumi Sato e Lie Kikuchi

segunda-feira, 11 de março de 2013

Publicado na Gazeta Regional de Goioerê 09/03/13


“Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta,

Que não há ninguém que não entenda.”

(Cecília Meireles)

Impossível falar sobre o Dia Internacional da Mulher sem citar essa MULHER brasileira... Guerreira, militante, mãe, avó, política exemplar, digna e PRESIDENTA do nosso país. Sim, estou falando de Dilma Vana Rousseff, essa brasileira incrível que poderia ter se conformado em ser apenas mais uma burguesa desfilando na alta sociedade mineira, mas que buscou um ideal focado no socialismo, na felicidade do povo brasileiro.

A história política dessa grande mulher inicia durante a repressão, período em que ela, ainda adolescente, cursava o colegial. Militante nos movimentos contra a Ditadura Militar essa mineira foi peça essencial dentro das organizações clandestinas em um tempo em que um cidadão poderia ser preso apenas por citar a palavra liberdade. Embora tenha participado de treinamentos de guerrilha, aprendendo a segurar uma arma, ela esteve envolvida na parte organizacional do movimento em Minas Gerais, sendo uma das responsáveis pela editoração do jornal O Piquete, além de dar aulas sobre marxismo e se impor perante homens que tinham como hábito apenas o dom de mandar.

Casa-se então com o companheiro de militância João Galeno e cai na clandestinidade em busca do único ideal dessa geração: o direito à liberdade.

Foi presa e torturada nos porões do Governo e mesmo assim não entregou seus companheiros, foi leal mesmo passando pelas mais desumanas formas de repressão.

Após ser libertada, reiniciou sua vida em Porto Alegre, adentrando na Universidade Federal do Rio Grande do Sul no curso de economia, já que a Universidade Federal de Minas Gerais, onde ela cursava o mesmo, havia jubilado e anulado os créditos dos alunos envolvidos nas lutas de esquerda. Teve como companheiro nessa época o militante Carlos Araújo, pois seu casamento com João Galeno acabou em função da distância e da luta dentro do movimento.

Dilma engaja-se na luta em favor da Anistia Política e das Diretas Já e junto com seu marido contribui para a formação do PDT em solo gaúcho. E finalmente em 86, assume um cargo de grande prestígio dentro do governo do estado, sendo Secretária da Fazenda.

Sua vida pública a partir de então inclui os cargos de Presidente da Fundação de Economia e estatística e Secretária de Minas e Energia do Estado, levando o mesmo a se safar do efeito apagão do Governo de FHC. Foi por esse grande trunfo que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva a convida para participar de sua equipe de transição e, por conseguinte, a ocupar o cargo de Ministra de Minas e Energia.

Sua reputação no cargo foi de uma competência absurda, levando o presidente a nomeá-la Ministra Chefe da Casa Civil, estando assim à frente dos maiores projetos do governo.

E foi com uma postura de mulher durona e competente que o PT a lança como candidata à presidência do país. Disputando em grande estilo e sendo eleita no segundo turno com um número de votos louvável. Tornando-se enfim a primeira mulher da história a governar a República Federativa do Brasil.

Sua luta, sua força e sua competência são de grande exemplo para todas as mulheres e servem como incentivo para não desistir de seus sonhos.

“A vida quer é coragem”

 

Presto aqui minha homenagem a todas as mulheres desse país que acordam cedo todos os dias, sacodem a poeira e saem às ruas em busca de seus objetivos. Àquelas que mesmo com todos os compromissos e encargos não perdem a alma feminina, a vaidade e a beleza que nos tornam tão diferentes dos homens.
....


“Homens – Vocês foram geradas a partir de nossa costela.

Mulheres – Não, vocês que são gerados a partir de nosso útero!”

Publicado na Gazeta Regional de Goioerê em 02/03/13


“Sou rainha do meu tanque
Sou Pagu indignada no palanque

Fama de porra louca
Tudo bem...”

(Pagu - Rita Lee/Zélia Duncan)


 

Falar de feminismo hoje, não se resume em queimar sutiã e bater de frente com os homens, o Dia Internacional da Mulher não é somente a data típica de saudar as vítimas do lamentável acontecimento que ocorreu nesta mesma data em 1857, em Nova Iorque. Esse dia hoje representa as conquistas das mulheres ao longo dos séculos, que com seus atos, seja dentro de casa, criando seus filhos, seja trabalhando, constroem um mundo melhor e mais digno. O dom de acalmar, de revolucionar, de amar dentro de cada mulher, nada mais é que um instinto, que está implícito em cada uma delas, em todos os cantos desse mundo.

Uma personagem mitológica dentro de nossa história empresta uma magnífica biografia hoje, para iniciarmos nossas reflexões sobre grandes mulheres brasileiras. Patrícia Galvão, a imponente PAGU.

Primeira comunista a ser presa em nosso país, primeira feminista da história nacional, mãe, companheira, militante, atriz, símbolo de beleza nacional, intelectual, guerrilheira, professora, jornalista, jovem explorada assim como muitas durante sua infância, tendo uma precoce iniciação sexual, até por não saber do que se tratava, em 1934 consegue as sementes de soja com o imperador Pu-Yi dando assim inicio ao cultivo do cereal no Brasil. Pagu não simboliza apenas uma luta política, representa o que é ser MULHER, em uma época machista e ditatorial da história de nosso país.

Companheira de Oswald de Andrade, tendo um casamento um pouco conturbado até que o mesmo torna-se apenas amizade, fez parte da Semana de Arte Moderna, viajou o mundo conhecendo a realidade dos mais necessitados, sacrificando o convívio com seu próprio filho, até então menor de idade, por um ideal humanitário, para lutar contra a fome e a diferença de classes.

Conheceu e debateu com personagens importantes da história mundial, assim como René Crevel, André Breton, Jean-Paul Sartre, Eugénie Ionesco, Raul Bopp, Freud, Tarsila do Amaral, Norah Borges, Luís Carlos Prestes, entre outras personalidades da época.

Em setembro de 1962, portadora de um câncer, tenta suicídio em Paris, cidade que ela amava profundamente e falece em 12 de dezembro do mesmo ano em Santos.

Por mais que eu tente exprimir neste curto espaço suas conquistas, me cerco de um sentimento de pouco aproveitamento de sua biografia, sua história merece ser pesquisada, merece ser estudada a fundo, pois nela é refletida a luta feminina por direitos de ordem humanitária e por valorização da mulher, não só como uma bela figura, mas como representante de seu povo.

Pagu é uma personalidade que exprime o orgulho nacional por essas guerreiras que acordam todos os dias em busca de um país melhor, de melhores condições para criarem seus filhos em um mundo muitas vezes exclusivo da autonomia masculina. E é por elas que hoje faço essa pequena homenagem a todas as que, assim como eu, acreditam em um futuro decente para as próximas gerações.

Por fim, vale lembrar que neste mês, farei uma sequência, em homenagem ao Mês das mulheres, relembrando e saudando grandes mulheres da história política nacional.

“Porque,
Nem toda feiticeira é corcunda,
Nem toda brasileira é bunda,
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho que muito homem!”

(Pagu – Rita Lee/Zélia Duncan)

sexta-feira, 1 de março de 2013

Publicado na Gazeta Regional de Goioerê em 23/02/2013


Vem vamos embora que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer”.

(Geraldo Vandré)

 

Carlos Mariguella permanece vivo na memória daqueles que buscam um mundo menos desigual.

Em 09/11/2012, após uma luta contra a lei nacional defendida por sua viúva, enfim Carlos Mariguella recebe a “Anistia Post Mortem”, o país então reconhece a perseguição que o guerrilheiro teve do estado brasileiro e concede este ato, nada mais justo, embora tenha sido tarde, foi um ato de dignidade para sua família que após tanto sofrer pode obter.

Clara Charf, sua esposa, então viúva, obteve o reconhecimento do estado em 1996, recebendo então uma pensão pouco significativa do governo, porém o reconhecimento pós-morte veio seis anos depois. Sua família não exigiu reparação econômica por sua morte prematura, deixando de provir com o sustento da mesma, apenas exigiu a legitimação da morte pelo DOPS e não pelos meios que a Ditadura insistiu afirmar.

Narrar tais fatos, de certa maneira, é um tanto quanto frustrante, visto que seriam totalmente desnecessárias tantas mortes prematuras se o país tivesse agido de forma clara e se o golpe militar não tivesse manchado nossa história. Mas infelizmente, não podemos mudar essa triste realidade nacional.

Ainda sofremos o impacto do atraso que esse período nos deixou como legado, mas felizmente o país está enxergando um novo rumo desde 2002 quando a esperança venceu o medo e o povo brasileiro oportunizou entregar a um operário o seu primeiro diploma, o de presidente da república.

Acredito na memória de guerreiros como Mariguella e na força de tantos outros que estão por vir. O principal segredo dos bons políticos é o amor por seu país e não só ao seu financeiro, como tantos outros que vagaram com faixas oficiais pelo Palácio do Planalto.

Em memória a este guerrilheiro encerro aqui essa trilogia, que de certa forma foi uma homenagem a todos aqueles que acreditam nessa tão amada pátria Brasil.

                                                                                                                                                                                       Liberdade

Não ficarei tão só no campo da arte,
e, ânimo firme, sobranceiro e forte,
tudo farei por ti para exaltar-te,
serenamente, alheio à própria sorte.

Para que eu possa um dia contemplar-te
dominadora, em férvido transporte,
direi que és bela e pura em toda parte,
por maior risco em que essa audácia importe.

Queira-te eu tanto, e de tal modo em suma,
que não exista força humana alguma
que esta paixão embriagadora dome.

E que eu por ti, se torturado for,
possa feliz, indiferente à dor,
morrer sorrindo a murmurar teu nome”

(Carlos Mariguella - São Paulo, Presídio Especial, 1939)

 

Publicado na Gazeta Regional de Goioerê 16/02/2013


“... esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer”.

(Geraldo Vandré)

 

Carlos Mariguella, inimigo número um da Ditadura Militar, foi um militante ativo, um baiano que não se contentou em apenas reclamar da realidade do país e seguiu em frente, rumo aos seus ideais.

Em 1932, foi preso pela primeira vez, em função de suas atividades políticas, sob ordem de Juracy Magalhães, interventor colocado pela Ditadura Vargas, que anos depois, já em 1947, foi deputado, durante o mesmo período do mandato que Mariguella exerceu, sendo uma das “pedras no sapato” do revolucionário.

Além de ter passado por perseguições absurdas, por prisões, por espancamento, Carlos teve um episódio lembrado por muitos, como heroico. Perseguido, certo dia, entra em um cinema e leva um tiro ali mesmo, o qual exibiu a marca da bala até seus últimos dias, como uma vitória contra a repressão.

Mariguella participou da guerrilha armada contra a Ditadura, fez treinamentos em Cuba, participou dos “assaltos” que tanto marginalizam hoje, mas que foi alicerce para o Movimento contra a repressão. Foi o mesmo que se levantou contra o burocratismo e o conformismo do velho PCB e arrastou consigo centenas de bravos militantes para formar a ALN.

Um herói que teve uma morte grotesca e da maneira mais fria possível, típico de um sistema falho de um governo absurdamente cruel.

Um exemplo de garra, esse baiano que poderia se conformar, mas que foi atrás de escrever seu capítulo na história nacional.

“Mariguella é o centro, a figura política por excelência da luta contra a ditadura, aquele que representou o que de melhor tem o povo brasileiro”. (Jorge Amado)

 

“Mariguella tinha razão?

A resposta depende da posição de cada um. Mas o que não padece dúvida é que a luta de esquerda, em suas várias modalidades, foi e é um dos esforços mais importantes nesse século para tentar estabelecer no mundo uma norma mais justa e mais humana de vida em sociedade” ( Antônio Cândido)

 

- Essa coluna faz parte de uma trilogia sobre a história de Carlos Mariguella, sendo esta a segunda publicação sobre o homenageado.